O jogo de soma zero: como a corrida por atenção está sabotando o ecossistema digital

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Tempo de Inovacao
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Representação de experiência do usuário - trade marketing

O mercado de mídia digital enfrenta um cenário insustentável. O crescimento explosivo no número de criadores de conteúdo, influenciadores, freelancers, miniagências e anunciantes tradicionais gerou um excesso de mensagens que disputa um recurso finito: a atenção do consumidor. No Brasil, o tempo médio de tela já ultrapassa nove horas diárias, mas o consumo real das famílias subiu apenas 3,72% em 2024, mostrando o limite de expansão dessa atenção.

Esse desequilíbrio cria o chamado Jogo de Soma Zero: o sucesso de um anunciante acontece às custas da perda de visibilidade de outros. Como resultado, há aumento dos custos de mídia, queda na qualidade dos leads, elevação do custo de aquisição de clientes (CAC) e uma experiência cada vez pior para o consumidor. Em 2024, o CPC no Google cresceu 5%, mas o CAC subiu 20%, evidenciando que o problema não está apenas no custo da mídia, mas na perda de eficiência das campanhas.

A saturação de anúncios também impacta o comportamento dos usuários. Prova disso é que um em cada cinco jovens de 18 a 24 anos desativou suas contas em redes sociais, e mais de 800 milhões de dispositivos no mundo utilizam bloqueadores de anúncios. Em vez de buscar soluções estratégicas, muitos anunciantes reagem ampliando investimentos nas mesmas práticas que alimentam o problema: campanhas genéricas, baseadas em volume e dependentes exclusivamente de dados de terceiros (3rd party data) fornecidos por plataformas como Meta, Google e Apple.

Essa concentração é visível nos números: Meta e Google devem absorver até 96% do orçamento de mídia digital em 2025, com crescimento projetado de 23% e 18%, respectivamente. Ao mesmo tempo, o mercado publicitário digital brasileiro alcançará R$ 37,9 bilhões em 2024, um aumento de 8% sobre o ano anterior, contrastando com a elevação de 20% no CAC. A raiz do problema está na falta de inteligência de dados e na dependência excessiva das ferramentas das próprias plataformas.

A solução para quebrar esse ciclo passa por uma mudança estrutural na estratégia dos anunciantes. O caminho envolve assumir o controle dos próprios dados por meio de iniciativas de Data Ownership e Data Activation, com foco no uso de First Party Data. O primeiro passo é conhecer profundamente o cliente ideal, mapeando perfis detalhados com base em históricos de compra, comportamento, engajamento e dados do CRM. Isso permite a construção de audiências próprias e lookalikes personalizados, baseados em interações reais, como visitas a sites, uso de apps e respostas anteriores a campanhas.

Ao reduzir a dependência de dados de terceiros, as marcas ganham mais controle sobre quem impactam e como fazem isso. A definição de perfis de clientes de alto valor (Personas ou ICPs) deixa de ser baseada apenas em percepções subjetivas e passa a utilizar inteligência de dados, machine learning (ML) e IA. Esses recursos comparam padrões entre clientes valiosos e de baixo valor, utilizando atributos como demografia, renda, crédito, bens e afinidades comportamentais.

Com o enriquecimento de dados e o suporte de Big Data ou Data Lakes, os anunciantes conseguem identificar múltiplas personas com necessidades distintas. Um exemplo prático seria uma academia que pode identificar públicos como terceira idade (interessados em longevidade), jovens (focados em estética) ou executivos (voltados para performance). A partir desses insights, é possível criar audiências segmentadas e altamente precisas.

Ou seja, ao invés de depender apenas dos algoritmos genéricos das plataformas, os anunciantes podem construir seus próprios “aquários de prospecção”, replicando com exatidão as características das personas definidas por seus modelos de dados. Essas audiências são então ativadas nas plataformas por meio de ferramentas, como Custom Audiences (Meta) e Customer Match (Google), com campanhas mais relevantes e eficientes. O resultado é menos desperdício de mídia, mais conversão e uma fuga do ciclo de bids crescentes e públicos saturados.

A implementação dessa estratégia exige também atenção total à conformidade com legislações de privacidade, como a LGPD. Todo o processo de coleta de First Party Data deve ocorrer com consentimento explícito (opt-in), de forma transparente. Durante as análises, os dados são mantidos anônimos e agregados, sem exposição de informações pessoais identificáveis (PII). Na fase de upload para as plataformas, a criptografia (hashing) garante segurança e privacidade, com as próprias plataformas fazendo o match dos usuários de forma segura.

Além disso, os anúncios seguem todas as diretrizes de privacidade, como limites de frequência, opções de opt-out e transparência nas motivações dos anúncios exibidos. A identidade individual do usuário permanece protegida até o momento em que ele, por vontade própria, realiza um novo opt-in ao interagir diretamente com a marca.

A grande vantagem dessa abordagem é a possibilidade de impactar menos pessoas, porém com muito mais precisão, relevância e retorno. Em um cenário onde a disputa por atenção se tornou um “jogo de soma zero”, as marcas que investirem na construção de audiências proprietárias e em inteligência de dados terão uma vantagem competitiva real e sustentável.

Paulo César Costa – CEO da PH3A, referência no mercado de Tecnologia da Informação. Matemático, cientista da computação e autoridade em DBM e CRM, Paulo criou sua primeira empresa em 1995, a Informarketing, e seus algoritmos (matchcode, modelos de crédito e fraude) foram valiosos para as operações de grandes empresas e responsáveis pela prospecção de cartões de crédito dos principais bancos no Brasil